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Só em situações excecionais o pagamento em numerário pode ser recusado

Só em situações excecionais o pagamento em numerário pode ser recusado
Quarta-feira 09 - 18:30
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Ainda que os portugueses façam pagamentos, cada vez mais, através de meios eletrónicos, o dinheiro ainda assume um papel essencial. E, por isso, o pagamento em numerário não pode ser recusado: salvo algumas exceções.

Um estudo do Banco Central Europeu (BCE) refere que Portugal é um dos países da zona Euro onde o uso de dinheiro físico mais desceu entre os anos de 2019 e 2022.

Em território nacional, não é legal que os estabelecimentos comerciais recusem pagamentos em dinheiro físico. A lei especifica que o numerário é um meio de pagamento de aceitação obrigatória, exceto em casos especiais. Isto significa que os estabelecimentos não podem recusar o pagamento em dinheiro, a não ser em circunstâncias muito específicas previstas na lei, como questões de segurança pública ou razões devidamente fundamentadas.

É obrigatório aceitar numerário

“A lei estabelece que o numerário é um meio de pagamento de aceitação obrigatória para a liquidação de dívidas. Isto significa que, em condições normais, qualquer estabelecimento comercial ou entidade que preste serviços deve aceitar dinheiro como forma de pagamento”, começa por explicar, ao i, um advogado especialista em Direito Fiscal. “A única exceção a esta regra são os casos em que o pagamento ultrapassa os limites de numerário definidos na lei ou se houver razões devidamente justificadas, como preocupações com segurança pública”, explicita.

“O valor máximo permitido para pagamentos em numerário entre particulares (pessoas singulares) é de 5.000 euros. No caso de pagamentos que envolvam empresas ou pessoas sujeitas a IVA, o limite é de 1.000 euros. Isto aplica-se tanto a transações comerciais como a prestações de serviços”, continua, adiantando que “se uma das partes tiver a sua residência fiscal fora de Portugal, o limite para transações em numerário é de 10 mil euros”. “Estes limites aplicam-se a transações únicas ou a transações fracionadas que aparentem ser uma única operação, no intuito de evitar o uso de numerário em grandes volumes, o que facilita a evasão fiscal e o branqueamento de capitais”, frisa o especialista.

“A violação desta lei pode resultar em coimas. As empresas ou indivíduos que aceitarem ou realizarem pagamentos em numerário acima dos limites estabelecidos podem estar sujeitos a multas que variam entre 180 euros e 4.500 euros, dependendo da gravidade da infração e da natureza da entidade envolvida”, observa o advogado. Embora esta legislação tenha por objetivo reduzir o uso de numerário em grandes transações, recusar o pagamento em numerário para montantes abaixo dos limites legais é uma infração.

Ou seja, os estabelecimentos não podem, por exemplo, recusar pagamentos em dinheiro com o objetivo de incentivar o uso de cartões ou de outros meios eletrónicos. “Em casos de transações de valor elevado, como compras de imóveis ou automóveis, onde os valores tendem a ser altos, as transações geralmente têm de ser realizadas por transferência bancária ou outros meios que se possam rastrear”, menciona o especialista ouvido pelo i, avançando que “existem exceções previstas para situações especiais, como eventos que envolvem questões de segurança pública – como é o caso dos festivais de verão – ou quando o pagamento em numerário coloca em risco a segurança do estabelecimento”.

Ou seja, em termos práticos, os estabelecimentos comerciais não podem recusar pagamentos em numerário abaixo dos limites definidos pela lei. O incumprimento da aceitação de dinheiro físico pode levar a sanções, exceto em circunstâncias muito específicas e justificadas.

O que se passa lá fora?

A situação relativamente à aceitação de numerário e os limites aos pagamentos em dinheiro varia de país para país mas, por exemplo, já aqui ao lado, em Espanha, há limites rígidos. O limite máximo entre particulares e empresas é de 1.000 euros. Este valor foi reduzido em 2021 (anteriormente era de 2.500 euros) para reforçar as medidas contra a evasão fiscal. Quando uma das partes reside fora de Espanha, o limite aumenta para 10 mil euros. O país também exige que os comerciantes aceitem numerário, mas podem recusar notas de grande denominação (por exemplo, notas de 500 euros) por razões práticas.

Não muito longe também, em França, os pagamentos em numerário são permitidos, mas com limites significativos. O limite máximo para transações entre empresas e particulares é de 1.000 euros. No caso de turistas não residentes em França, o limite é aumentado para 15 mil euros. Já Itália tem vindo a implementar medidas rigorosas para reduzir o uso de numerário. Assim, o limite para pagamentos em numerário é de 1.000 euros para a maioria das transações.

No Reino Unido, não existem limites máximos obrigatórios para pagamentos em numerário, mas as instituições financeiras são obrigadas a comunicar transações suspeitas de grandes valores em numerário às autoridades, em conformidade com as regras de combate ao branqueamento de capitais. O pagamento em numerário é bastante aceite, mas a maioria dos estabelecimentos comerciais opta por aceitar pagamentos eletrónicos e por limitar o uso de numerário por razões de segurança e comodidade.

A Alemanha é um dos países da Europa onde o uso de numerário é mais comum e culturalmente aceite. No entanto, não há um limite legal para pagamentos em numerário, o que contrasta com muitos outros países europeus. Apesar de não haver limites legais, as autoridades fiscais têm reforçado o controlo sobre grandes transações em numerário.

Nos EUA, não há limites federais para pagamentos em numerário, mas existem regras rígidas para reportar transações em dinheiro acima de 10 mil dólares (o equivalente a 9.120 euros). Instituições financeiras e empresas que realizam transações em numerário acima desse valor são obrigadas a submeter relatórios à Financial Crimes Enforcement Network (FinCEN) para prevenção de branqueamento de capitais.

 


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